Syro Cabral de Oliveira
Em
entrevista ao Fantástico, TV Globo, domingo,
12 de abril de 2020, o
ex-deputado federal eleito pelo Mato Grosso do Sul e atual ministro da
saúde, Luiz Henrique Mandetta, citou o Mito da Caverna, de Platão,
dizendo que “é pela ciência que se sai da caverna da ignorância.”
Em relação a essa entrevista, circula um texto, sem autor, nas
redes sociais, em especial, no WhatsApp, que achamos pertinente citar
um trecho do mesmo aqui e fazermos as nossas ponderações. Eis
abaixo o excerto do referido texto:
“Então, para sair verdadeiramente para fora da caverna, é
preciso essa prova ética de autenticidade pondo-se frente a frente a
si mesmo, adequando discurso e prática. Pois há aqueles que
conseguem chegar apenas ao limiar e retornam, pois entre mudar a si
mesmos ou continuar enganando os outros, eles preferem tirar proveito
do rebanho e retornam à caverna para ser os pastores e tiranos dos
acorrentados que ignoram que estão presos. Estes que não têm
autenticidade e ética Platão os chama de “sábios da caverna”,
que se aproveitam da servidão e posam de sábios e chefes, quando na
verdade são tiranos. Para Platão, a luz científica é capaz de
conduzir apenas à boca da caverna. Pois para sair realmente da
caverna, é preciso a luz ética. E o mais importante: quem sai,
vence a si mesmo primeiro e vê como é o mundo que existe fora da
caverna, porém não se contenta em ficar contemplando tal “verdade”
apenas para si mesmo. Pois a razão de ser dessa luz que existe fora
da caverna é fortalecer quem a conhece e se autoconhece a partir
dela, adquirindo assim força existencial e pedagógica para retornar
à caverna para ajudar a libertar quem ainda continua preso nela
enfrentando os tiranos do corpo e da alma."
Esta
passagem do texto parece-nos bastante oportuna para ilustrar o
momento atual, sobretudo, quando se levam em consideração os
discursos de cunho inteiramente persuasivos, que, possivelmente, têm
por finalidade última levar às pessoas ao temor, à insegurança e
à dúvida.
Não
se deve certamente tratar o ser humano a partir de um rigor
matemático. Dizer que as pessoas são infectadas, segundo uma
progressão geométrica, é de uma tamanha leviandade, falta de
idoneidade e respeito para com o ser humano, que até chega nos
colocar em dúvida acerca da autoridade de certos profissionais, sobretudo,
quando se trata de quem se especializou e atua no âmbito da saúde.
É
preciso entender, no entanto, que não há ciência acerca do ser
humano em sentindo absoluto, ou seja, não há conhecimento, em
definitivo, que explique a natureza última do ser humana em sua
inteireza. Sabemos que há pessoas, mesmo que se encontrem entre
doentes, que não se infectam. É sabido também que já se
introduziram células cancerígenas em determinados indivíduos saudáveis, a
fim de experimentos, sem que se obtivessem resultados positivos.
O
ser humano é imprevisível em todos os campos do conhecimento, quer
que seja no âmbito da saúde, no do mercado financeiro, no dos
estudos sociológicos etc.
Sabemos
que muitas pessoas que já foram desenganadas pelos médicos, com
previsão de vinte a trinta dias de vida, viveram, no entanto, entre
quinze, vinte anos ou até mais, após a funesta profecia.
Não
há ninguém, até hoje, que tenha uma explicação absolutamente
plausível para a queda vertiginosa ou a subida íngreme e constante
da bolsa de valores em um determinado dia.
Do
mesmo modo, também, verificamos que muitas pesquisas eleitorais são,
muitas vezes, um verdadeiro fiasco em relação aos resultados
apresentados nas urnas.
Tudo
que envolva o ser humano é inteiramente imprevisível. Tentar fazer
previsão e explicar, com rigor matemático, os casos relacionados
aos seres humanos é naturalmente uma falta de honestidade sem
precedentes. Ou seja, tentar associar as pesquisas científicas frias, desenvolvidas no interior de laboratórios, de indivíduos particulares, fundadas
em rigorosos métodos científicos, a verdades absolutas e, ao mesmo
tempo, aplicá-las, de maneira generalizada, a totalidade do universo dos indivíduos é,
certamente, um verdadeiro embuste “científico”, com o intuito
naturalmente de conduzir o grande rebanho ao
bel-prazer.
E, nesse caso, não deixaria de ser um truque de má-fé, como
explicita a citação do excerto acima descrito. “Pois há aqueles
que conseguem chegar apenas ao limiar (da caverna) e retornam, pois
entre mudar a si mesmos ou continuar enganando os outros, eles
preferem tirar proveito do rebanho e retornam à caverna para ser os
pastores e tiranos dos acorrentados que ignoram que estão presos.”
Assim
sendo, um cientista que vê o mundo a partir somente do ponto de
vista de sua ciência é tão ignorante quanto aquela pessoa que não
possui nenhum conhecimento científico.
Nesse
sentido, o que importa mesmo é a amplitude de visão. Diríamos que
as coisas se passam da seguinte maneira em relação a um homem que
habita o topo de uma montanha em oposição a um outro que habita seu
sopé. O primeiro enxerga ao longe, contemplando a infinitude do
horizonte, ao passo que o último vê somente uma ínfima parte do
horizonte, mas, mesmo assim, se supõe conhecer a totalidade de todas
as coisas.
Texto extremamente bem escrito!
ResponderExcluirEu discordo do seu ponto de vista em relação à ciência. Creio que ela deva vir, sim, em primeiro lugar. O restante, vai de cada indivíduo: fé, religião, estilo de vida etc.
Agradeço muito teu comentário.
ResponderExcluirA ciência também tem seus limites, até porque ela foi feita pelos seres humanos. Se a natureza humana é imperfeita; logo, sua obra, certamente, será imperfeita.
Amigo Prof.Syro Cabral,sempre com suas produções de altíssima relevância no vibe da questão em que estamos vivendo e vivenciando.Tragédia pela qual nosso "líder"ignora e dá mau exemplo. Algo que dá muito o que falar, até com relação às exceções mencionadas e não em vias de regra. Nada é objetivo, com relação à vida e tudo que a envolve...Imprevisível sim. Porém a Ciência nos ajuda e sempre nos ajudou e muito.Deus nos LIVRE se não fosse a pinicilina, os antibióticos, as vacinas de prevenção contra HIV ( testando),vacina contra poliomielite, etc...etc...De acordo com a boa metáfora daquele que habita o cume da montanha com relação ao outro do sopé, acho que contemplar a amplitude é profundo e sábio, porém em algum momento ele terá que descer. Mesmo com seus conhecimentos tem seus limites para com a vida. Um precisará do outro. Obrigada! Um abraço.
ResponderExcluirCertamente, teremos que descer das alturas, mas, também, devemos compreender que a crença cega é muita perniciosa. A ciência, com as suas descobertas, que deram resultados positivos, se não tomar os cuidados necessários, pode se tornar tão dogmática quanto às religiões.
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