sexta-feira, 15 de agosto de 2014

UMA QUESTÃO DE CONVENIÊNCIA



Syro Cabral de Oliveira

Ao fazermos uma leitura, ainda que rápida, do artigo "A Educação de Jovens e Adultos no Brasil: políticas e práticas", de Érica Cruz, Márcia Ribeiro Gonçalves e Munich Ribeiro de Oliveira, publicado na Plataforma do Cecierj, o que nos chamou atenção, no referido texto, foi, sobretudo, a maneira ingênua de abordar questões tão sérias.

Não se trate de desinteresse, como afirma o texto, com a educação, mas sim de interesse absolutamente consciente de se tratar a educação, aqui no Brasil – não vamos incluir países exteriores, porque não conhecemos sua realidade –, da forma que se tratou no passado e tal como se trata hoje em dia. Já se afirmou, muitas vezes, que é preferível que se mantenha a criança ou o adolescente na escola, mesmo se ela ou ele não esteja aprendendo nada – e desse modo ela ou ele deve obter notas, sem que de fato nada produza –, pois o fato de ela ou de ele estar na escola não estaria praticando delitos na rua, justifica. Já se disse, também, que o trabalhador não deve ter muito tempo livre, se não ele comete crimes ou destrói a natureza.

Essas são as ideias das classes dominantes, não importa se elas são praticadas nos meios de produção capitalista ou socialista, há sempre um olhar de cima para baixo. Ou há, simplesmente, uma classe pobre e outra rica, logo esta última é tida como possuidora de “plena consciência” de toda a produção; ou há um grupo grande, mas simplesmente dominado e outro menor, mas, este último, também, “cônscio” de toda a realidade de poder, exercendo o papel de dominador. Esta é a lógica da relação entre poder e não poder. É, infelizmente, o jogo da natureza, queira sim queira não, seja uma segunda natureza (um hábito), seja uma natureza de fato.

O artigo em referência afirma, ainda, que houve um tempo, no Brasil, por volta da década de 40, que não havia grande interesse em educar a classe trabalhadora, sobretudo, quando se refere aos trabalhadores rurais. Ora, diríamos que não houve e também não há nenhum interesse, atualmente, em educá-la, no sentido de tornar o homem melhor em si, pois todo processo de educação se dá em absoluta conveniência com os interesses do momento. Pensar que a abolição da “escravidão” e a “emancipação” das mulheres foram grandes conquistas é tão tolo quanto pensar que quando se investe em educação de jovens e adultos, hoje em dia, tem, por finalidade última, conscientizar essas pessoas.

Sabe-se que a abolição da escravidão e a emancipação das mulheres se deram em conformidade com os interesses, com as conveniências do senhor e do mercado de trabalho naquele momento. No primeiro caso, os escravos tornaram-se muito caros aos senhores, porque, naquela época, o escravo era um bem do senhor e como tal poderia ser negociado livremente no mercado, logo o senhor deveria zelar por ele, dando-lhe uma alimentação adequada, moradia, vestimenta e remédio, ao passo que “libertando”-o não mais teria essa obrigação, bastando pagar um salário fixo e caso fique doente, despensa-o, sem maiores custos. No caso das mulheres, uma vez elas “conquistando” sua "liberdade", concorrem livremente no mercado de trabalho com os demais trabalhadores, empurrando assim o valor dos salários para baixo.

Assim, também, pode se pensar que se há ou se houve um interesse em investir no processo de educação dos jovens e adultos, esse interesse não se deu e nem se dá no sentido de melhorar o homem em si, mas em conveniência com as regras do mercado capitalista. É sabido de todos que no passado não se usavam máquinas no campo, pelo menos em grande escala, pois as atividades eram todas ou quase todas braçais, logo não se tinha necessidade de uma pessoa com nível de instrução mais elevado. Nas zonas urbanas, as fábricas eram poucas e de pequenos portes. Assim, de um período para cá, tanto no campo, como também, nas zonas urbanas, ampliou-se assustadoramente o uso de máquinas tanto nas grandes como nas pequenas empresas. Um trabalhador que não tenha o mínimo de instrução dá mais prejuízo às empresas que lucro, uma vez não ter condição de explorar o máximo do potencial das máquinas e, além disso, causa grandes danos aos equipamentos. Sem mencionar, também, que o mercado consumidor atual precisa de consumidores que tenham um mínimo de instrução. Por isso que nos países subdesenvolvidos – ignoramos totalmente a realidade dos desenvolvidos –, no que tange à educação, não há o menor interesse em incluir, em suas grades curriculares, disciplinas tais como filosofia e os estudos clássicos: grego e latim, pois esses países não necessitam de seres pensantes, mas de pessoas que satisfaçam o mercado de consumo.

Para concluir, perguntaríamos: será que uma pessoa, sem nenhuma instrução, teria condição de consumir um Smartphone, um Notebook, um Tablet, um Celular etc., atualmente!?

domingo, 10 de agosto de 2014

PARA REFLETIR

  Syro Cabral de Oliveira

Quantificar uma aula é realmente uma situação muito difícil. Se imaginarmos que podemos pensar o tempo de duas maneiras: um tempo quantitativo e um outro qualitativo (cronos e kairós), vamos chegar à clara conclusão de que quantificar uma aula é uma tarefa totalmente estranha a uma proposta de um processo educativo sério; a menos que não se diferencie educação de um processo de produção econômica. No âmbito do processo educativo, o tempo considerado é o kairós, isto é, o chamado tempo oportuno, o momento certo. Embora poder-se-ia pensar no cronos, um tempo quantitativo, mas apenas para não ultrapassar um determinado espaço de tempo que deve ser administrado entre um horário e outro.

E, se de um lado – no que se refere ao esforço de levar o aluno a modificar o seu modo de pensar e abrir a sua mente para novos horizontes –, não podemos pensar em tempo apenas quantitativo, porque, nem sempre o tempo previsto para uma aula corresponde de fato à experiência de sala de aula; e, de um outro lado, um determinado conteúdo programático pode ser transmitido por um professor a uma turma e entendido por todos alunos em um tempo quantitativo muito menor em relação a um outro professor que sequer não consegue fazer um único aluno entendê-lo.

Parece-nos que um bom professor não é aquele que segue um tempo matemático, mas aquele que tira proveito das oportunidades que lhe aparecem nas circunstâncias de suas aulas. Desse modo, todas suas aulas seriam singulares, visto que elas seguiriam as circunstâncias apropriadas oferecidas pelos seus alunos em turmas diferentes.

Além disso, seguir um projeto faz-se necessário, mas com uma certa parcimônia. A obsessão por projeto é um grande risco e pode levar a sérios problemas, sobretudo quando se trata de educação. As economias planificadas , tais como as da antiga Rússia e da velha China – para não falar na remanente Cuba – não passaram de um fiasco e de um grande fracasso, serviram apenas para mostrar que o abuso de projetos é muito danoso. E de quebra, poderíamos também citar toda a América latina, que não se decide claramente a que meio de produção seguir – cujo modelo de educação é muito mais um esquema doutrinador do que de fato educador, a exemplo dos países já mencionados. Quando, na realidade, o verdadeiro papel da escola seria o de fazer com que os seus alunos tornassem indivíduos resolutos, independentes e senhores de si, que pudessem fazer as suas próprias escolhas e não se deixarem levar por propagandas ideológicas.

De tempo em tempo, surgem ideias enquadradoras, que tem por objetivo apenas de modelar docentes, com planos disso e daquilo, sem que resultem em dados realmente convincentes. Há professores que se envaidecem e tentam exibir uma sapiência sem par de todos esses modelos e projetos mirabolantes, mas quando entram em sala de aula são um verdadeiro fracasso. São exatamente como alguns dos nossos teóricos, que falam com desenvoltura acerca das normas morais e coisas do gênero e as ensinam com toda pompa, mas agem, no seu dia a dia, exatamente ao contrário em relação ao que dizem.

É preciso de fato que se invista urgente em um modelo de ensino que não só tenha por finalidade última coadunar um agir efetivo com um pensamento reflexivo e realmente produtivo, do lado dos educadores, mas também de fazer com que os educandos conscientizem-se de seu verdadeiro papel no processo de educação, ou seja, o dos seus deveres e da sua responsabilidade. Só através de uma conscientização mútua é que podemos colher bons frutos. Fora disso, todo esforço será em vão.

Se não seguirmos esse caminho e apenas tentarmos atrair alunos para a escola, sem um critério bem definido, correremos o sério risco de cairmos na situação daquele professor que pôs um grupo de alunos em sala de aula e lhe pediu que observasse durante um tempo estipulado. Transcorrido o tempo, o professor perguntou ao grupo o que havia observado. Alguns alunos deram respostas contraditórias e desconcertantes, outros disseram qualquer coisa para não dizer nada e outros ainda disseram – os mais corajosos – que nada haviam observado, pois não foi dito o que deveria ser observado. O nosso ilustre professor, infelizmente, só não sabia que ele deveria direcionar o grupo para um ponto bem definido, o qual deveria ser observado.

Sem meta, sem ponto a atingir, sem deveres e sem responsabilidade nenhum ser humano, por mais capaz que seja, não alcança nenhum êxito.