sexta-feira, 2 de setembro de 2016

O PRIMADO DE UMA EDUCAÇÃO POLÍTICA

 Syro Cabral de Oliveira

Em um país, cujo povo, em que sua maioria esmagadora, não consegue distinguir, com clareza, uma forma de governo de um modo de produção, não possui, infelizmente, a menor condição de escolher os seus governantes. Esse povo, na realidade, é sempre governado por uma forma de opressão disfarçada. Vive, simplesmente, uma ditadura sem que dela tenha plena consciência. Sua liberdade se resume a apenas em determinados períodos, ou seja, nos períodos de eleições, momento em que ele se encontra inteiramente livre para escolher os seus representantes. Uma vez estes escolhidos, tal povo volta logo para o seu estado anterior, sem qualquer direito de tirá-los do poder, mesmo que, na prática, esses tais representantes eleitos não venham cumprir com que prometeram em campanha.

Infelizmente, depois de eleitos, esses homens, denominados de seus representantes, se assenhoram do poder como se este se tornasse a sua verdadeira propriedade. Governam os municípios, os estados da federação e o país inteiro de acordo com o seu bel-prazer e sua vontade pessoal, sem dar qualquer satisfação aos seus eleitores. De período em período, cada grupo que chega ao poder, governa à sua maneira, sem necessidade de seguir um princípio norteador do supremo ideal do país.

No Congresso Nacional elaboram leis em prol de determinados grupos e em conveniência com os seus próprios interesses e as promulgam, sem que os seus eleitores ao menos sejam ouvidos.

Diante de suas ações, o povo se comporta como simples espectadores em uma plateia, só assistindo aos atores decidindo por ele. Mesmo que as decisões não sejam do seu agrado, é obrigado a concordar, pois nada pode fazer. Tal modo de agir é absolutamente estranho a uma verdadeira democracia, visto que, nessa referida forma de governo, toda decisão deve emanar diretamente do povo.

Assim sendo, nas atuais democracias, o cenário é de uma grande e lastimável decepção, pois as pessoas do povo veem-se completamente impotentes e despidas de suas próprias vontades em face das decisões que têm por objetivo nortear a vida coletiva. O povo se sente inteiramente à parte e alheio em relação aos afazeres públicos, a ponto de se referir aos homens que se encontram no poder simplesmente pelo termo “eles”. Assim, se ouvem, no dia a dia, quando está a se referir aos governantes: “São eles que decidem”, “São eles que fazem”, “Eles que são responsáveis por isso”, “Isso é com eles”, “São eles que devem resolver” etc., como se houvesse, na prática, um Estado à parte, o que é absolutamente contrário a um Estado bem governado. "Quanto melhor estiver o Estado constituído, tanto mais os negócios públicos prevalecerão sobre os particulares no espírito dos cidadãos. Chega mesmo a haver muito menor número de negócios privados, porque a soma de felicidade comum fornece maior porção à felicidade de cada indivíduo, de modo que menos lhe resta a procurar em suas ocupações particulares. Numa cidade, bem dirigida, todos votam nas assembleias; sob um mau governo, ninguém aprecia dar um passo para isso fazer, porque ninguém se toma de interesse pelo que se faz, prevendo que a vontade geral não prevalecerá, e porque, enfim, os cuidados particulares tudo absorvem. As boas leis permitem que se façam outras melhores; as más conduzem às piores. Tão logo diga alguém, referindo-se aos assuntos do Estado, que me importo? pode-se ter a certeza de que o Estado está perdido.

0 entibiamento do amor à pátria, a atividade do interesse privado, a imensidade dos Estados, as conquistas, os abusos do governo, fizeram imaginar a criação de deputados ou representantes do povo nas assembleias da nação. E a isso que, em certos países, se ousa chamar de terceiro estado. Assim, o interesse particular de duas ordens é posto no primeiro e no segundo plano; o interesse público é relegado ao terceiro", afirma Jean-Jacques Rousseau em O Contrato social.
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Qualquer pessoa, ao assistir, com toda a atenção, a uma seção do Congresso Nacional, com o propósito de se decidir acerca dos assuntos relativos aos interesses coletivos, sente-se inteiramente indignada e enojada ao ver um pequeno grupo de homens – ou mesmo, um único homem  aprovando ou rejeitando, de acordo com as suas próprias conveniências, assuntos que dizem respeito a vida coletiva do país e que jamais poderiam ser resolvidos apenas por um determinado grupo de pessoas que se diz representar a vontade da nação inteira. Neste contexto, faz-se necessária, urgentemente, no país, uma educação política, inteiramente desassociada de princípios ideológicos, que leve, cada cidadão, a ter plena e inteira consciência da sua importância e de seu papel nas decisões coletivas.

Enquanto se toma uma grande parte do tempo dos alunos das escolas de ensino médio com uma série de disciplinas que são absolutamente inúteis para o seu dia a dia, dever-se-ia direcionar o foco desta fase de ensino para uma real formação do ser humano como um todo. Neste aspecto, dever-se-ia, então, centrar, sobretudo, em disciplinas que têm por objetivo último o desenvolvimento do homem como um ser pensante e consciente de seu próprio dever e de sua responsabilidade, não só no que se diz respeito ao seu progresso pessoal e ao do seu país, mas também no que se refere ao seu próprio atraso e, igualmente, ao de seu país.


Dever-se-ia fazer com que, além disso, o homem se conscientize de que as questões relativas ao bem e ao mal não advêm do seu exterior, mas do seu próprio interior e que ele compreenda, também, que a sua felicidade depende, exclusivamente, de suas próprias ações. Logo, uma boa educação teria que, acima de tudo, primar por objetivos que não só tornem o homem um ser completamente responsável pelos seus atos e pelo que acontece ao seu redor, mas também um ser que se torne inteiramente capaz de contribuir para mudar ou alterar o curso de todos os acontecimentos que dizem respeito à sua própria vida e à da vida coletiva.

2 comentários:

  1. Muito boa reflexão, nescessaria e essencial para se pensar na educação tão precária que ainda se oferece no Brasi.

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