Syro Cabral de Oliveira
Em um país, cujo povo, em que sua maioria esmagadora, não consegue
distinguir, com clareza, uma forma de governo de um modo de produção,
não possui, infelizmente, a menor condição de escolher os seus
governantes. Esse povo, na realidade, é sempre governado por uma
forma de opressão disfarçada. Vive, simplesmente, uma ditadura sem
que dela tenha plena consciência. Sua liberdade se resume a apenas
em determinados períodos, ou seja, nos períodos de eleições,
momento em que ele se encontra inteiramente livre para escolher os
seus representantes. Uma vez estes escolhidos, tal povo volta logo
para o seu estado anterior, sem qualquer direito de tirá-los do
poder, mesmo que, na prática, esses tais representantes eleitos não
venham cumprir com que prometeram em campanha.
Infelizmente, depois de eleitos, esses homens, denominados de seus
representantes, se assenhoram do poder como se este se tornasse a sua
verdadeira propriedade. Governam os municípios, os estados da
federação e o país inteiro de acordo com o seu bel-prazer e sua
vontade pessoal, sem dar qualquer satisfação aos seus eleitores. De
período em período, cada grupo que chega ao poder, governa à sua
maneira, sem necessidade de seguir um princípio norteador do supremo
ideal do país.
No Congresso Nacional elaboram leis em prol de determinados grupos e
em conveniência com os seus próprios interesses e as promulgam, sem
que os seus eleitores ao menos sejam ouvidos.
Diante de suas ações, o povo se comporta como simples espectadores
em uma plateia, só assistindo aos atores decidindo por ele. Mesmo
que as decisões não sejam do seu agrado, é obrigado a concordar,
pois nada pode fazer. Tal modo de agir é absolutamente estranho a
uma verdadeira democracia, visto que, nessa referida forma de
governo, toda decisão deve emanar diretamente do povo.
Assim sendo, nas atuais democracias, o cenário é de uma grande e
lastimável decepção, pois as pessoas do povo veem-se completamente
impotentes e despidas de suas próprias vontades em face das decisões
que têm por objetivo nortear a vida coletiva. O povo se sente
inteiramente à parte e alheio em relação aos afazeres públicos, a
ponto de se referir aos homens que se encontram no poder simplesmente
pelo termo “eles”. Assim, se ouvem, no dia a dia, quando está a
se referir aos governantes: “São eles que decidem”, “São
eles que fazem”, “Eles que são responsáveis por
isso”, “Isso é com eles”, “São eles que devem
resolver” etc., como se houvesse, na prática, um Estado à parte,
o que é absolutamente contrário a um Estado bem governado. "Quanto
melhor estiver o Estado constituído, tanto mais os negócios
públicos prevalecerão sobre os particulares no espírito dos
cidadãos. Chega mesmo a haver muito menor número de negócios
privados, porque a soma de felicidade comum fornece maior porção à
felicidade de cada indivíduo, de modo que menos lhe resta a procurar
em suas ocupações particulares. Numa cidade, bem dirigida, todos
votam nas assembleias; sob um mau governo, ninguém aprecia dar um
passo para isso fazer, porque ninguém se toma de interesse pelo que
se faz, prevendo que a vontade geral não prevalecerá, e porque,
enfim, os cuidados particulares tudo absorvem. As boas leis permitem
que se façam outras melhores; as más conduzem às piores. Tão logo
diga alguém, referindo-se aos assuntos do Estado, que
me importo?
pode-se ter a certeza de que o Estado está perdido.
0 entibiamento do amor à pátria, a atividade do interesse privado, a imensidade dos Estados, as conquistas, os abusos do governo, fizeram imaginar a criação de deputados ou representantes do povo nas assembleias da nação. E a isso que, em certos países, se ousa chamar de terceiro estado. Assim, o interesse particular de duas ordens é posto no primeiro e no segundo plano; o interesse público é relegado ao terceiro", afirma Jean-Jacques Rousseau em O Contrato social.
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Qualquer pessoa, ao assistir, com toda a atenção, a uma seção do
Congresso Nacional, com o propósito de se decidir acerca dos
assuntos relativos aos interesses coletivos, sente-se inteiramente
indignada e enojada ao ver um pequeno grupo de homens – ou mesmo, um único homem – aprovando ou
rejeitando, de acordo com as suas próprias conveniências, assuntos
que dizem respeito a vida coletiva do país e que jamais poderiam ser
resolvidos apenas por um determinado grupo de pessoas que se diz
representar a vontade da nação inteira. Neste contexto, faz-se
necessária, urgentemente, no país, uma educação política,
inteiramente desassociada de princípios ideológicos, que leve, cada
cidadão, a ter plena e inteira consciência da sua importância e de
seu papel nas decisões coletivas.
Enquanto se toma uma grande parte do tempo dos alunos das escolas de
ensino médio com uma série de disciplinas que são absolutamente
inúteis para o seu dia a dia, dever-se-ia direcionar o foco desta
fase de ensino para uma real formação do ser humano como um todo.
Neste aspecto, dever-se-ia, então, centrar, sobretudo, em
disciplinas que têm por objetivo último o desenvolvimento do homem
como um ser pensante e consciente de seu próprio dever e de sua
responsabilidade, não só no que se diz respeito ao seu progresso
pessoal e ao do seu país, mas também no que se refere ao seu
próprio atraso e, igualmente, ao de seu país.
Dever-se-ia fazer com que, além disso, o homem se conscientize
de que as questões relativas ao bem e ao mal não advêm do seu
exterior, mas do seu próprio interior e que ele compreenda, também,
que a sua felicidade depende, exclusivamente, de suas próprias
ações. Logo, uma boa educação teria que, acima de tudo, primar
por objetivos que não só tornem o homem um ser completamente
responsável pelos seus atos e pelo que acontece ao seu redor, mas
também um ser que se torne inteiramente capaz de contribuir para
mudar ou alterar o curso de todos os acontecimentos que dizem
respeito à sua própria vida e à da vida coletiva.
ESTADO esta perdido
ResponderExcluirMuito boa reflexão, nescessaria e essencial para se pensar na educação tão precária que ainda se oferece no Brasi.
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